A INTERPRETAÇÃO EGOCÊNTRICA
José Carlos Manhabusco[1]
Não se pretende aqui, tratar do egocentrismo infantil, conceituado por Jean Piaget (psicólogo suíço), como sendo “a confusão inconsciente do ponto de vista próprio com o ponto de vista dos outros”. Tampouco descobrir os mistérios da hermenêutica.
A proposta de reflexão diz respeito a compreensão do procedimento de subsunção do interprete a um determinado fato (social ou jurídico) de acordo com o juízo de realidade ou juízo de valor, e a literalidade do dispositivo aplicado ao caso concreto.
Tentar desvendar a razão do intérprete EM optar por seguir caminho essencialmente subjetivo (juízo de valor - opinião), sem, no entanto, cuidar de que o fenômeno possa trazer sérios prejuízos aos que buscam amparo na norma que rege a matéria em apreço é o desafio proposto.
A lógica desse raciocínio merece ser investigada e pensada, pelo menos nos meandros da força do poder e da posição diante dos outros participes da relação social ou jurídica. A expressão de um processo psicológico em que a vontade pessoal se sobrepõe a realidade verificada em outras situações equivalentes, não obstante as áreas obscuras que a cercam, desafiam a incursão no modelo representativo.
Trata-se de esclarecer o juízo de valor do tipo “eu é que dou a última palavra”, ou do estado de espírito típico no exercício do cargo ou função exercida naquele momento (posição).
Não se pode perder de vista que o processo pode trazer consequências de caráter moral e social, se tornando um problema ético, pois o excesso acaba por transbordar naquilo que era para ser limitado e dentro dos padrões normais de atuação.
Segundo a publicação no site: significados.com.br, pesquisa em 29/12/2018, às 16h, veja como descreve o egocentrismo:
“Egocentrismo é a condição ou estado de espírito do egocêntrico. Tem origem no grego, sendo a junção de egôn e kêntron, que significa "eu no centro". O egocentrismo consiste em uma exaltação excessiva da própria personalidade, fazendo com que o indivíduo se sinta como o centro da atenção. Uma pessoa egocêntrica não consegue demonstrar empatia, ou seja, não consegue colocar no lugar do outro, porque está constantemente ocupado com os seu "eu" e com os seus próprios interesses. Um indivíduo egocêntrico é também egoísta, porque pensa só em si ou pelo menos pensa em si mesmo em primeiro lugar. Ex.: Ele só pensa no seu próprio bem! Aposto que se você pesquisar na internet a definição de egocentrismo, com certeza vai aparecer a foto dele.
Também de acordo com a publicação no site: significados.com.br, pesquisa em 29/12/2018, às 16h, veja como descreve a epistemologia:
Epistemologia significa ciência, conhecimento, é o estudo científico que trata dos problemas relacionados com a crença e o conhecimento, sua natureza e limitações.
É uma palavra que vem do grego. A epistemologia estuda a origem, a estrutura, os métodos e a validade do conhecimento, e também é conhecida como teoria do conhecimento e relaciona-se com a metafísica, a lógica e a filosofia da ciência. É uma das principais áreas da filosofia, compreende a possibilidade do conhecimento, ou seja, se é possível o ser humano alcançar o conhecimento total e genuíno, e da origem do conhecimento. A epistemologia também pode ser vista como a filosofia da ciência. A epistemologia trata da natureza, da origem e validade do conhecimento, e estuda também o grau de certeza do conhecimento cientifico nas suas diferentes áreas, com o objetivo principal de estimar a sua importância para o espírito humano. A epistemologia surgiu com Platão, onde ele se opunha à crença ou opinião ao conhecimento. A crença é um ponto de vista subjetivo e o conhecimento é crença verdadeira e justificada. A teoria de Platão diz que conhecimento é o conjunto de todas as informações que descrevem e explicam o mundo natural e social que nos rodeia. A epistemologia provoca duas posições, uma empirista que diz que o conhecimento deve ser baseado na experiência, ou seja, no que for apreendido durante a vida, e a posição racionalista, que prega que a fonte do conhecimento se encontra na razão, e não na experiência.
Então, partindo-se do egocentrismo e da epistemologia, podemos alcançar algumas vertentes de caráter tanto psicológico como filosófico.
Necessário destacar que a distorção psíquica-cognitiva do intérprete modifica de maneira direta o processo de subsunção e persuasão racional. Quanto mais desenviesado o procedimento comportamental do intérprete, mais próximo ele ficará da apuração da verdade real e da imparcialidade. Isso importa, de certa forma, em não confundir “imparcialidade” com “neutralidade”.
O intérprete, no caso, o julgador, tem o dever e a obrigação de indicar a razão lógica-jurídica de como chegou a essa ou aquela conclusão (prova – exemplo). Não se pode admitir apenas o “eu acho que”; “a meu ver”; “a meu sentir”. Isso não passa de exercício da mera opinião subjetiva, e não da motivação e fundamentação científica, sendo que o eventual posicionamento pessoal deve ceder lugar à disciplina judiciária.
A aproximação da apuração dos fatos mediante o exame das relações causais que os interligam e as circunstâncias que os singularizam, com certeza, fazem parte da engenharia na construção da correta e exata motivação, sob pena de prejudicar a efetiva apreciação e o exercício da garantia aos princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório e dos meios e recursos a eles inerentes, evitando, assim, a negativa da prestação jurisdicional.
Em entrevista à TV Senado, o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, quando indagado sobre a compreensão e o alcance dos dispositivos constitucionais, destacou em sua fala: “a intepretação conforme a Constituição Federal, a interpretação na modalidade ativismo judicial e a interpretação de acordo com a excentricidade judicial”.
No que tange ao ativismo judicial, o cientista jurídico Lenio Luiz Streck nos ensina:
Olhem ao redor e me respondam estas 12 perguntas: (I) Alguém consegue receber uma resposta adequada em algum embargo de declaração? (II) Alguma alma consegue, sem matar cinco jacarés e escapar de snipersepistêmicos, “passar” um recurso aos tribunais superiores? (III) Alguém consegue entender por que, (a) mesmo vencendo em primeiro grau e em segundo grau e, (b) mesmo tendo a parte contrária não conseguido juízo de admissibilidade do recurso, (c) esta vence a ação com base em decisão monocrática no STJ, em que, (d) provendo o agravo, (e) já se dá provimento ao próprio REsp e o seu direito vira pó?
O direito é isso? (IV) Alguém consegue entender que raios de “sistema de precedentes” é esse de que falam alguns doutrinadores? (V) Por que os tribunais editam teses como se súmulas fossem? (VI) Alguém consegue fazer valer o novo CPC? (VII) Por que o Código Civil vale menos do que o que os pamprincípios? (VIII) Alguém consegue enfrentar decisões que dizem que, já convencido, o juiz ou tribunal não necessita enfrentar todos os argumentos da parte? (IX) Alguma pobre alma jurídica consegue entender porque os juizados especiais se transformaram em ilhas autoritário-despóticas das quais não se pode fugir? (X) E por que a doutrina permitiu que o nosso Direito fosse transformado em um jurisprudencialismo? (XI) Por que sucumbimos à tese amotinadora de que os fins justificam os meios? (XII) Por que admitimos heterodoxia no Direito? Por que... Complete você.
Desta maneira, a persuasão racional e o livre convencimento, sem a evidência científica, não podem servir para justificar a ausência da correta interpretação e abrangência, pois, tal modo compromete a manutenção da jurisprudência uniforme, estável, íntegra e coerente.
VIVA O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO!!!
[1] Advogado. Membro da Academia de Direito Processual de Mato Grosso do Sul (Conselho Editorial). Especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil. Formado pela Escola Superior de Magistratura do Estado de Mato Grosso do Sul. Autor de 4 (quatro) livros editados pela Editora LTR. Membro fundador e Professor do Instituto de Pesquisa e Ensino Jurídico - IPEJUR – Dourados-MS. Membro fundador e Professor da Associação dos Advogados Trabalhistas de Dourados-MS – AATD. Professor colaborador da ESA/MS. Ministrou aulas de Direito Processual Civil, Prática Processual Civil, Direito Administrativo, Introdução ao Estudo do Direito e de Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho. Membro da banca dos concursos para ingresso na carreira de Promotor Público do Estado de Mato Grosso do Sul, na magistratura do trabalho do TRT da 24ª Região e no cargo de delegado de polícia civil do Estado de Mato Grosso do Sul. Ex-conselheiro Estadual da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do MS. Medalha de Mérito Jurídico Heitor Medeiros (OAB/MS). Membro da Ordem Guaicurus do Mérito Judiciário do Trabalho – TRT da 24ª Região. Medalha Prêmio da Polícia Civil do estado de Mato Grosso do Sul. Autor de diversos artigos publicados na Revista da Editora LTr - SP. Colaborador do jornal “O PROGRESSO”, Dourados – MS.